Corri pelas margens do texto, tentando afastar-me de tudo quanto no livro era intriga, mistério e sobressalto. Pensei mesmo em suicidar-me, atirando-me da página abaixo ou tentando cair fora do livro. Mas não logrei atingir nenhum desses objectivos, porque o livro operava o prodígio de me devolver sempre ao coração do seu enredo, envolvendo-me em novas peripécias.
(...)
Sentia que a palavra «salvação» me abandonara e que nunca chegaria a fazer parte do meu parco vocabulário de aprendiz do mundo. Estava perdido. Queria rezar, mas não sabia nenhuma oração de cor, porque os meus pais não eram devotos, nem a ideia de sagrado tinha o que quer que fosse a ver com a minha casa.
José Jorge Letria in A Mão Esquerda de Cervantes
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